A Bíblia costuma, com frequência, falar de uma oferta que consiste em 10%. Literalmente é chamada "a décima parte". Em hebraico, no Antigo Testamento, a palavra usada para indicar dízimo é ma‘aser, que significa, como dito acima, ‘a décima parte’. O grego, no Novo Testamento, usa a palavra dekate, que tem o mesmo significado. Normalmente se usa o verbo apodekato, ou seja ‘dar a décima parte’.

Já tratamos deste tema aqui e é muito comentado. Dê uma olhada nas outras respostas. Abaixo repito algumas ideias que julgo serem importantes para dar uma resposta breve ao seu questionamento.

 

No Antigo Testamento

 O dízimo pertencia a Deus e era dado aos levitas conforme dito em Números 18,21, como se fosse a herança deles, pois a tribo de Levi não obteve para si, quando o povo entrou na terra prometida, nenhum território. Os animais porém não pertenciam aos levitas. E os próprios levidas deviam dar a Deus o dízimo daquilo que recebiam como dízimo (Números 18,26 seguintes).
 
O dízimo era dado no templo. Porém a cada 3 anos devia ser levado até o local onde os levitas moravam e doado aos pobres, estreangeiros, órfãos e viúvas, com os quais se devia fazer uma refeição (Deuteronômio 14,28 seguintes).

 

No Novo Testamento

Textos importantes, no Novo Testamento, são

Mateus 23,23: "Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, que pagais o dízimo da hortelã, do endro e do cominho, mas omitis as coisas mais importantes da lei: a justiça, a misericórida e a fidelidade. Importava praticar estas coisas, ma sem omitir aquelas. (a mesma passagem em Lucas 11,42)

Lucas 18,9-14: a passagem do fariseu e do publicano, que são contrapostos: o fariseu fazia tudo certinho, inclusive pagava o dízimo de todos os seus rendimentos, enquanto que o publicano, tido pelo povo como um ladrão a serviço do império romano, pedia perdão. Jesus louva o publicano.

Hebreus 7,5: Os filhos de Levi, chamados ao sacerdócio, devem, segundo a Lei, estabelecer o dízimo par ao povo, isto é, para seus irmãos, conquanto são descendentes de Abraão.

 

Jesus e a Lei

Jesus nunca questiona o fato do dízimo, dado segundo a Lei. Não podemos pensar em Cristo como um revolucionário, que procura liberar o povo da Torah, da Lei. Para Jesus a Lei é dom de Deus. Ele, invés, tenta resgatar o verdadeiro sentido que ela tem: foi dada ao povo para aproximá-lo de Deus, para fazer com que caminhe pela reta via. Com os fariseus, invés, ela havia se tornado um mero formalismo, perdendo o seu espírito. Jesus e sua família, com certeza, seguiam os costumes religiosos, como todo o povo. Aquilo que é evidente, sobretudo na passagem de Mateus e Lucas, a primeira citada acima, é que essa lei não pode ser um mero exercício piedoso, mas expressão de solidariedade, de condivisão. Esses valores, invés de serem abolidos pelo cristianismo, foram enfatizados.

 

Conclusão

É importante notar que o dízimo, na sua origem, não é destinado aos sacerdotes, mas tem como intenção sanar uma disigualdade social: compensar a falta de propriedade que atingia os levitas. Os sacerdotes, invés, sobreviviam com os sacrifícios que o povo oferecia, que eram diferentes do dízimo. Frizamos, contudo, que existe uma grande confusão neste campo, pois graças sobretudo ao livro de Números os sacerdotes, descentendes de Aarão, são considerados Levitas. Porém, se lemos Ezequiel, por exemplo, existe uma nítida diferença entre sacerdotes e levitas. E depois, a confusão aumentou por que o dízimo era entregue no Templo e portanto, parece, que era controlado pelos sacerdotes. De qualquer forma o fato que a Lei obrigue a cada 3 anos que o dízimo não seja levado ao templo, mas pessoalmente aos levitas e pobres (veja Deuteronômio 14,28 seguintes), sublinha o aspecto de caridade do dízimo. Além disso, para deixar claro que o dízimo não era uma coisa dos sacerdotes, o próprio sacerdote era obrigado a pagar dízimo daquilo que recebia (Números 18,26 seguintes).

É importante, por último, falar do aspecto teológico do dízimo. Com o dízimo se exprime a convinção que tudo aquilo que se possuiu é fruto da bondade divina. Nessa linha deve ser lido o texto de Lucas 18,9-14, onde Jesus conta uma parábola que fala do dízimo praticado pelos fariseus no tempo de Jesus, que era meramente uma prática, sem nenhuma espiritualidade. O dízimo em si não é importante, mas significa uma das expressões possíveis do reconhecimento da existência de Deus nas nossas vidas. Além do mais Jesus nos ensina que o fundamental da Lei transmitida no Antigo Testamento é a Justiça, a misericórdia e a fidelidade.

Do meu ponto de vista, tirado de uma reflexão dos textos bíblicos, penso que ainda hoje o dízimo seja uma das expressões possíveis do modo de ser típico do cristão. Todavia ele deve ser expressão de gratidão e uma forma de solidariedade que tenha como meta as pessoas excluídas da sociedade e não simplesmente uma retribuição pelo trabalho do padre ou pastor.