O elenco dos livros bíblicos, chamado "cânon da Bíblia", do ponto de vista católico, foi definido por um concílio, aquele de Florença, em 1441, e confirmado pelo Concílio de Trento (veja no final do artigo o texto dos dois Concílios). O Concílio é formado por bispos e pelo Papa. Os protestantes tiveram o elenco definido por Lutero, no período da Reforma, que coincide com o Concílio de Trento.

 

A lista dos livros da Bíblia

A sua pergunta exige uma resposta bastante articulada; não pode ser respondida com duas frases. Não repito aqui tudo que já foi dito em outra ocasião, mas queria dar uma panorâmica geral e no final uma resposta direta à pergunta.

Primeiro de tudo é necessário explicar que a formação da Bíblia é um processo complexo e a definição do cânon, da lista dos livros que a compõe, se deu durante vários séculos, tendo sido dogmatizada só no final desse caminho.

Outro elemento essencial é enteder que existe uma história diferente para a lista dos livros do Antigo Testamento e do Novo Testamento. Os livros do Antigo Testamento fazem parte também da Bíblia Hebraica, aquela usada até hoje pelos judeus. A definição dos livros do Antigo Testamento está intimamente ligada à história da religião judaica.

Nenhum autor da Bíblia escreveu seu livro pensando: “estou escrevendo uma obra que será inserida na Bíblia”. O que determinou a importância desses escritos do ponto de vista judaico e cristão foi o uso que a comunidade fez deles.

 

O Cânon do Antigo Testamento

Os livros do AT já existiam no tempo de Cristo. Os cristãos os usavam como inspiração para a sua vida de fé. Eles tinham uma lista de livros que os judeus julgavam como inspirados. Essa lista é confirmada por textos de Josefo (Contra Apião 1,8), de 4 Esdras (14,37-48) e do Talmude. Mas havia alguma discordância no mundo judeu. Alguns (fariseus) pensavam que os livros inspirados eram somente os 39, escritos em hebraico; outros (judeus fora da Palestina e cristãos) acreditavam que deviam ser incluídos também outros 7, escritos em grego (Tobias, Judite, Sabedoria, Eclesiástico, Baruc, 1 Macabeus e 2 Macabeus); havia também aqueles que queriam contar só o Pentateuco (Saduceus); e seitas (essênios) queriam ainda incluir seus próprios livros entre aqueles inspirados.

Dentro desse cenário apareceram os cristãos, que parece terem usado a lista dos 46 livros, como aparece na Bíblia Católica de hoje.

Em contraste com os cristãos, oficialmente os judeus definiram essa lista por volta do ano 90 depois de Cristo, com o Concílio de Jâmnia. Essa decisãa foi apenas para os judeus. No tempo da Reforma (século XVI) os protestantes, desejando fazer traduções diretamente do hebraico, terminaram por considerar o cânon judaico como o cânon autêntico inerente aos livros do Antigo Testamento, enquanto que os católicos, com o Concílio de Trento, composto por bispos, determinaram que a lista dos livros bíblicos devia incluir também aqueles 7 mencionados acima, somando 46 livros, ao invés dos 39 propostos por Lutero.

Uma das teses dos católicos para incluir esses 7 livros é a autoridade que eles tinham na primeira comunidade cristã. De fato,  o Novo Testamento e inclue citações explicitas de ao menos três desses livros: Eclesiástico, 2Macabeus e Sabedoria.

 

O Cânon do Novo Testamento

A formação do elenco dos livros do Novo Testamento hoje nos parece menos problemática, porque católicos e protestantes temos igualmente 27 livros iguais. Todavia, no decorrer da história, essa lista não foi uma unanimidade. Livros como Apocalipse, carta de Judas e aos Hebreus tiveram alguma dificuldade para serem reconhecidos como canônicos, mas no final entraram na lista.

Veja nesse link uma descrição detalhada da história de aceitação dos livros do Novo Testamento através de testemunhos de escritos dos padres da igreja e outros autores históricos.

 

Definição da lista dos livros bíblicos

Como já dissemos, o elenco dos livros do Antigo Testamento está intimamente ligado à religião hebraica. Mas, em geral, podemos dizer que foi a tradição a determinar quais são os livros considerados como inspirados por Deus e, portanto, terem um lugar na Bíblia.

Historicamente, a igreja toma uma posição sobre o cânon, tanto do NT quanto do AT, no concílio de Florença (1441), fornecendo o elenco dos livros bíblicos segundo o cânon longo, isto é, incluindo os 7 livros em grego do Antigo Testamento. No tempo da Reforma, Lutero não aceita esses livros como inspirados e, ao invés, o Concílio de Trento confirma a lista definida um século antes como sendo aquela definitiva, válida até hoje na Igreja Católica.

Por isso, a Bíblia Católica tem 73 livros e a Protestante 66.

 

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Decreto do Concílio de Florença

“Decretum pro laçobitis (ex Bulla « Cantate Domino », 4 Fev. 1441)

O Sacrossanto concílio professa que um e o mesmo Deus é o autor do Antigo e Novo Testamento, isto é, da Lei, dos profetas e do Evangelho, pois os Santos de ambos os Testamentos falaram sob a inspiração do mesmo Espírito Santo. Este Concílio Aceita e venera os Seus livros que vêm indicados pelos títulos seguintes: O Pentateuco de Moisés, isto é, Genesis, Êxodo, Levítico, Números, Deuteronômio; Josué, Juízes, Rute, quatro livros dos Reis[7], 2 dos Paralipômenos[8], Esdras, Neemias, Tobias, Judite, Ester, Jó, o Saltério de Davi[9], as Parábolas (Provérbios), Eclesiastes, Cântico dos Cânticos, Sabedoria, Eclesiástico, Isaías, Jeremias, Baruc, Ezequiel, Daniel, os Doze Profetas menores (isto é, Oseias, Joel, Amós, Abdias, Jonas, Miqueias, Naum, Habacuc, Sofonias, Ageu, Zacarias, Malaquias) e dois livros dos Macabeus. Quatro Evangelhos, Mateus, Marcos, Lucas e João; quatorze epístolas de Paulo, uma aos Romanos, duas aos Coríntios, uma aos Gálatas, uma aos Efésios, uma aos Filipenses, uma aos Colossenses, duas aos Tessalonicenses, duas a Timóteo, uma a Tito, uma a Filemon, uma aos Hebreus; duas epístolas de Pedro, três de João, uma de Tiago, uma de Judas, os Atos dos Apóstolos e o Apocalipse de João”. (SAINT LIBERÈ, 2008).

 

Concílio de Trento – 1546

O Concílio de Trento é o décimo nono Concílio Ecumênico da Igreja, começou em 13 de Dezembro de 1545, e encerrou em 4 de Dezembro de 1563. Seu objetivo principal foi a determinação definitiva das doutrinas da Igreja na disputa com os protestantes; Outro objetivo também era a execução de uma reforma profunda da vida interior da Igreja, removendo alguns abusos que se tinham desenvolvido dentro dela. 
Sobre o cânon bíblico, podemos ler quanto segue:

“... para que nenhuma dúvida possa surgir na mente de qualquer um, sobre quais são os livros que são recebidos por este Sínodo. Eles estão definidos como aqui abaixo:

Do Antigo Testamento: os cinco livros de Moisés, a saber, Gênesis, Êxodo, Levítico, Números, Deuteronômio, Josué, Juízes, Rute, quatro livros dos Reis, dois dos Paralipômenos, o primeiro livro de Esdras, e o segundo que é intitulado Neemias; Tobias, Judite, Ester, Jó, o Saltério de Davi, composto de cento e cinquenta salmos, os Provérbios, Eclesiastes, Cântico dos Cânticos, Sabedoria, Eclesiástico, Isaías, Jeremias, com Baruc, Ezequiel, Daniel, os doze profetas menores, a saber, Oseias, Joel, Amós, Abdias, Jonas, Miqueias, Naum, Habacuque, Sofonias, Ageu, Zacarias, Malaquias, dois livros dos Macabeus, o primeiro e o segundo.

Do Novo Testamento: os quatro Evangelhos, segundo Mateus, Marcos, Lucas e João; Atos dos Apóstolos, escrito por Lucas Evangelista; catorze epístolas de Paulo, o apóstolo: (uma) aos Romanos, duas aos Coríntios, (uma) aos Gálatas, aos Efésios, aos Filipenses, aos Colossenses, duas aos Tessalonicenses, duas a Timóteo, (uma) a Tito, a Filemon e aos Hebreus; duas de Pedro, o apóstolo; três de João o apóstolo; uma do apóstolo Tiago; uma de Judas o apóstolo e o Apocalipse de João, o apóstolo.

Mas, se alguém não receber, como sagrados e canônicos, os referidos livros inteiros com todas as suas partes, como são costumeiramente lidos na Igreja Católica, e como eles estão contidos na antiga edição da Vulgata Latina, e consciente e deliberadamente desprezar as antigas tradições; seja anátema.” (Enquiridium Biblicum, 2008).