Paulo, a Bíblia repete com constância a proibição de �??adivinhação, encantamentos, consulta a mortos�?�. E as citações são inúmeras (Levítico 19,31; Deuteronômio 18,10-12; 1 Samuel 28; Isaías 8,19, etc.). Mas você, de modo inteligente, pediu que a nossa resposta ultrapassasse o aspecto confecional.

A questão que você põe tem a ver com a arte da tradução. Os textos tomados em consideração pelo artigo que você cita (Levítico 20,6.27 e Deuteronômio 18,10-12) foram escritos originalmente em hebraico, há muito tempo atrás. Obviamente naquele tempo não existiam as palavras �??espíritas�?� e �??médiuns�?�. Essas palavras são, invés, presentes nas traduções �??Ave Maria�?� dos católicos e numa versão dos Testemunhas de Jeová (1967), conforme cita o artigo em questão. Sobre isso nasce a tese do artigo: certas palavras são usadas deliberadamente pelos tradutores para �??rebaixar�?� os espíritas.

Em hebraico se usa a palavra �??wob. O clássico Abridged BDB Lexicon diz que o sentido desta palavra pode ser: 1. Recipiente 2. Necromante 3. Fantasma 4. Necromância. A partir desta evidência, a melhor tradução deste vocábulo, nas passagens mencionadas, seria necromante. Evidentemente o uso de outro vocábulo suscita alguma perplexidade.

Contudo, analisando mais profundamente a questão, torna-se claro que esse problema é apenas uma agulha num palheiro. O papel do tradutor, segundo muitos especialistas, não é aquele de ser literal, mas transmitir, na própria língua, aquilo que o autor quis dizer na sua língua, aquela do texto original. Dou um exemplo banal, com a simples intenção de esclarecer a minha idéia. O hebraico, no Antigo Testamento, usa a palavra aniah para as embarcações usadas nos rios e mares. No tempo da Bíblia os tipos de embarcações eram poucos. Hoje, invés, quantos tipos de embarcações temos? E, em português, quantas palavras existem para nomear embarcações que navegam pelos mares e rios? Podemos dizer que erra quem traduz �??aniah�?� com �??barco�?�, invés de �??navio�?�? Normalmente se traduz por �??navio�?�, mas na époda bíblica os navios, segundo nossos conceitos, não existiam. De fato as embarcações eram pequenas e se pareciam muito mais com barcos. Contudo usar a palavra �??navio�?� nesses casos, com certeza, não é um erro. �? óbvio que os conceitos que as palavras �??navio�?� e �??necromante�?� representam não têm o mesmo nível de importância, mas penso seja útil para entender o problema.

Julgo como não muito boas as traduções que usam �??médiuns�?� e �??espíritas�?� em seus textos, invés de �??necromante�?�. Contudo, esse juízo não é devido ao fato que essas palavras não existiam no tempo em que a Bíblia foi escrita, mas devido à falta de clareza que tal uso pode comportar. De fato esses são termos marcados pelo preconceito que pode influenciar negativamente a compreensão objetiva da mensagem da passagem bíblica. Todo tradutor tem a liberdade de usar o sinônimo que julgar melhor, quando tenta traduzir um vocábulo. Obviamente a sua escolha influencia o valor final da sua obra. Talvez na cabeça de muitos, como por exemplo naquela dos tradutores das versões incriminadas, as palavras �??médium�?� e �??espírita�?� são sinônimos para �??necromante�?�. O autor do artigo que você cita discorda disso.