Prezada, Verônica, a sua pergunta sobre a moral do povo de Israel é muito interessante. Primeiro pensei em responder de forma objetiva, considerando unicamente o período dos reis, mas, analisando o Antigo Testamento como um todo, a minha reflexão pretende abrir uma perpectiva mais ampla. Imaginei responder, em linha de máxima, que o comportamento moral do povo na época em questão é considerado errôneo. Obviamente não só o povo erra, mas também os reis, os seus governantes.
O pecado no período dos reis, de 1000 a 580 antes de Cristo, é constantemente denunciado pelos profetas e a falta de conversão conduz à condenação divina e ao castigo que é a invasão de Jerusalém e o consequente exílio em Babilônia. O comportamento errado do povo é condenado com veemência por Deus, que tem, portanto, um caráter de juiz severo, árbitro da história. Isso por que o povo precisa obedecer à leis, dadas através de Moisés, se quer conservar a unidade e a identidade de povo. A sobrevivência de Israel depende da fidelidade à Lei, sendo o apoio de Deus condicionado à resposta moralmente positiva do povo.

São numerosos os textos bíblicos que mostram como a causa do exílio é a pouca fidelidade do povo a YHWH. Basta conferir Jr 5,1-6 e Ez 33,23-29, para citar dois profetas expoentes. Os profetas defendem que possuir a terra não é apenas uma questão de promessa, mas de seguimento de uma lei moral. E o povo, no período dos reis, faliu nessa empresa; não seguiu a lei moral ditada por Deus. Portanto, numa frase, a moral do povo no período dos reis não é boa aos olhos de Deus, que por isso o condena ao exílio, que é um tempo de expiação (Is 27,9).

Porém não queria terminar a resposta assim, mas gostaria de lembrar que a questão moral, o comportamento justo ou injusto, para nos entendermos, não é julgado na bíblia sempre da mesma maneira. No período dos reis, como dito acima, era evidente a repreensão dos profetas em ocasião do pecado do povo. Mas se pensamos em personagens, historicamente anteriores aos reis, parece que a questão moral não pesa tanto. Dá impressão que o Antigo Testamento, quando fala dos primeiros personagens da história da salvação, não quer somente apresentar modelos de virtude que devem ser seguidos. Realmente não importa muito se essas pessoas têm ou não defeitos, mas basicamente é considerato o fato que são fundadores, heróis do passado. Não importa se Abraão, Isaac e Jacó tenham tido defeitos, mas o fundamental é que são os patriarcas. O mesmo vale para Moisés, Sansão, etc.

Se paramos para pensar, o fato que Jacó, ajudado por Rebeca, tenha roubado de Esaú o direito de receber a benção do pai, Isaac, enganando-o (Gn 27), não é moralmente correto aos nossos olhos. Mas isso não importa para a Bíblia. Do mesmo modo o assassinato provacado por Moisés não é moralmente relevante (Ex 2,11-12). E nem mesmo a violência de Sansão (Jz 16) tira dele algum mérito.

Talvez é simples liquidar a questão assim, mas termino dizendo que para a Bíblia os seus personagens não pertencem social e moralmente a nenhuma classe priveligiada, mas fazem parte do povo comum e vivem os dramas comuns da humanidade.