Essa sua pergunta é muito comum entre os cristãos. Ela nasce da tensão existente entre o tema teológico da maternidade divina de Maria, sendo Jesus filho unigênito, e a narração evangélica que fala em sentido amplo da “família de Jesus”, como nessa passagem do Evangelho de Marco:

Chegaram então sua mãe e seus irmãos e, ficando do lado de fora, mandaram chamá-lo. Havia uma multidão sentada em torno dele. Disseram-lhe: ‘Eis que tua mãe, teus irmãos e tuas irmãs estão lá fora e te procuram’. Ele perguntou: ‘Quem é minha mãe e meus irmãos?’. E repassando com o olhar os que estavam sentados ao seu redor, disse: ‘Eis a minha mãe e os meus irmãos. Quem fizer a vontade de Deus, esse é meu irmão, irmã e mãe’ (Mc 3, 31-34).

Além de Marcos 3, citado acima, existem outros textos bíblicos que mencionam a expressão“irmãos de Jesus”: Mc 6,3-5; Jo 2,12; Jo 7,3.5.10; Atos 1,14; 1Cor 9,5; Gl 1,19.

Em síntese, existem duas correntes sobre esse argumento (veja outras respostas aqui): alguns cristãos são favoráveis à existência de irmãos carnais de Jesus e outros afirmam que a palavra “irmão” na Bíblia tem um sentido mais amplo do que o conceito de hoje e significa, no caso de Jesus, primos.

Não há uma resposta definitiva. Penso, como já tive oportunidade de afirmar, que a questão dos ‘irmãos de Jesus’ é sobretudo um tema dogmático. É muito mais simples acreditar que Jesus tenha tido irmãos, ma existem outras reflexões que precisam ser consideradas. Uma delas tem a ver com o conceito de "irmão" no ambiente bíblico, que certamente compreende também os membros da família que vão além daqueles que são do mesmo genitor. A palavra ‘primo’ (anèpsios) aparece uma única vez no Novo Testamento (Colossenses 4,10 – A tradução de Almeida nesse caso usa, de modo errado, ‘sobrinho’). Porém em outro livro em grego, Tobias (que não aparece na Bíblia Hebraica e, por isso, também não está nas bíblias evangélicas, mas cujo texto hebraico foi encontrado também em Qumran), os termos ‘anèpsios’ e ‘adelfós’ são usados sem distinção para significar primo ou parente em geral (cf. Tobias 7,1-4 e confrontar com Tobias 6,1). De fato, alguns manuscritos em 7,4 usam anèpsios, enquanto outros usam ‘adelfós’. Além do mais, o contexto bíblico nos obriga a recordar que o conceito de família naquele tempo era muito mais largo do que o atual: fazia parte da família, como irmãos (ah em hebraico), todos os que habitava a casa (bet em hebraico), o clam familiar. Outro aspecto é a tradição. Não é decisivo, mas acreditamos seja importante. Já no segundo século não havia dúvidas sobre a relação dos “irmãos” com Jesus: não eram filhos de Maria. Esse conceito continuou vigente inclusive no tempo da Reforma, com Lutero e Calvino. Somente nos últimos tempos ele voltou a ser questionado.

Concluímos dizendo que a tradição cristã afirma que aqueles que a bíblia chama ‘irmãos de Jesus’ são na verdade seus parentes. E, do nosso ponto de vista, a Bíblia não oferece argumentos para combater essa tese, mas nos dá alguns que podem sustentá-la.

Aconselho, se você tiver ainda mais interesse, ler esse artigo de João Batista Cascalho, disponível na rede, onde ele vê a possibilidade que, especialmente em Marcos, o termo "irmão" tenha a ver com o crer em Jesus, tornando-se "irmão de Jesus" todo aquele e aquela que pertencia à comunidade cristã.