Assim continua a colocação do nosso leitor:

Vejo algumas pregações falando, e com bases biblicas, que quem semeia pouco colhe pouco e quem semeia muito colhe muito. E dão o exemplo de Isaac. Isso vale também em relação a quanto mais ajudamos a obra Deus mais Ele multiplica nosso dinheiro?

Há uma corrente muito forte dentro do mundo evangélico que faz da teologia da retribuição uma verdadeira doutrina religiosa: se você der o que tem a Deus, Ele lhe dará o cêntuplo. Tudo isso é tido como baseado na Bíblia, em exemplos como o que você cita, de Isaac, que abençoado por Deus, na sua colheita recebe cem vezes mais (Gênesis 26,12). Também Jesus, como recorda Marcos 10,29-30, promete uma vida frutuosa (cêntuplo) àqueles que o seguem:

«Eu garanto a vocês: quem tiver deixado casa, irmãos, irmãs, mãe, pai, filhos, campos, por causa de mim e da Boa Notícia, vai receber cem vezes mais. Agora, durante esta vida, vai receber casas, irmãos, irmãs, mães, filhos e campos, junto com perseguições.

A promessa bíblica é evidente. Mas estamos falando de bens materiais, casas inúmeras, assistência religiosa na hora da morte, maior número de graças ou dons referentes à vida futura?

 

A realidade nos ilumina

Para começar a discernir, basta olharmos a realidade, já na Bíblia. De fato, há inúmeras pessoas fieis ao plano divino, que dão tudo a Deus, mas sofrem, que até mesmo perdem a vida, sobretudo no Novo Testamento. Pensemos, por exemplo, nos apóstolos, em Estêvão, o primeiro mártir, Pedro, Paulo...

Há tantas pessoas boas que sofrem, embora vivam fazendo o bem, com generosidade. O bem que elas fazem não tem nenhuma consequência, em termos de prêmios materiais, nas próprias vidas, embora não se possa dizer que não sejam cristãs autênticas. Obviamente, se conversamos com elas veremos que são pessoas realizadas, felizes, embora sofram.

 

A retribuição divina supera o material

O binômio fidelidade e recompensa, na relação de Deus com o ser humano, não pode ser entendido da mesma maneira que uma relação de trabalho entre o patrão e o empregado. O que conta, do ponto de vista religioso, é o amor de Deus. Deus nos ama independente da nossa ação. Ou seja, não é a justiça que calcula a recompensa merecida, mas o amor de Deus que vem ao encontro da boa vontade do ser humano. Por isso a recompensa não tem que ser esperada, pois não se ganha simplesmente com um bom comportamento. A aprovação final de Deus pode nos pegar de surpresa. Então os justos perguntarão: "Senhor, quando foi que ti vimos com fome..." (Mateus 25,34-40). É claro que Jesus fala de recompensa, mas nos alerta para que não confiemos no mérito. A recompensa é prometida exatamente para quem é obediente e não para quem almeja a recompensa em si: "Quem quiser preservar a sua vida perdê-la-á; e quem a perder de fato a salvará." (Lucas 17,33).