Os primeiros capítulos da Bíblia, do livro do Gênesis, suscitam nos leitores um fascínio grande. Alguns amam esses textos e outros não os entendem. Um dos principais elementos que divide os fieis é a relação desses textos com a história. Sob essa perspectiva, poderíamos dividir os leitores em três grupos.

1. Antipatia

A maioria dos leitores não entende o início da Bíblia. Eles veem nos primeiros capítulos de Gênesis informações caducas, incoerentes com as descobertas modernas, com a apresentação de um Deus que cria a humanidade para puni-la. Por isso, se são religiosos, retêm melhor ignorar tais páginas bíblicas e se dedicar a outros textos aparentemente mais coerentes e mais ricos de mensagens para a própria vida.

2. Simpatia

Leitores mais ortodoxos gostam de Gênesis. A maioria por que não consegue questionar a autoridade do autor sagrado. Entre estes, um grande número de leitores tem certeza de encontrar nessas páginas informações históricas, que contam como aconteceu o início da história humana sobre a terra e têm argumentos prontos para defender a coerência científica de quanto dito por Gênesis.

3. Exegetas, estudiosos...

Entre esses, com raras exceções, ninguém defende a historicidade das narrações dos primeiros capítulos da Bíblia, mas tentam contar como o autor sagrado quis ler a história humana a partir da sua fé no Senhor, usando elementos do contexto em que vivia, tais como os mitos e as compreensões científicas do seu tempo.

 

Conflito entre história e verdade

A maioria de nós pensa que a Bíblia é um livro histórico. “História” normalmente é entendida como informações objetivas de eventos acontecidos no passado. Esse conceito condiciona a leitura das páginas de Gênesis. Há séculos a igreja lê a Bíblia dessa maneira. Se alguém diz que não é assim, é provável que contará com poucos adeptos, mesmo usando argumentos muito claros. Essa lógica é evidente nos comentários das pessoas que intervêm aqui no site, que não conseguem escutar uma sugestão diversa de leitura do texto bíblico e rebatem toda tentativa, reafirmando a clássica interpretação.

Para mostrar como esse tema é questão de grande debate mesmo dentro da Igreja, cito três reações de autoridades católicas durante o século passado.

  • Em 1909, foram submetidas à Pontifícia Comissão Bíblica duas perguntas: “podemos dizer que os primeiros capítulos da Bíblia contêm elementos mitológicos adaptados à doutrina monoteística?”; podemos afirmar que esses capítulos trazem legendas fictícias elaboradas para a instrução e a edificação?” A ambas as questões a Comissão respondeu negativamente!
  • Em 1950, o Papa Pio XII falou sobre “falsas opiniões que ameaçam os fundamentos da doutrina”. Nessa ocasião ele afirmou que ninguém pode afirmar que pessoas nasceram fora da linhagem de Adão, que não é um símbolo de todos os seres humanos, mas alguém que historicamente existiu, responsável pelo primeiro pecado.
  • Em 1986 temos uma mudança significativa. O Papa João Paulo II afirmou que a origem do ser humano pode muito bem ser explicada pela teoria da evolução, desde que se sublinhe que a alma tenha sido criada diretamente por Deus.

Embora as altas esferas da Igreja tenham demorado tanto tempo para entender a verdade bíblica, outros personagens já tinham indicado o caminho correto para interpretar as primeiras páginas da Bíblia.

Um desses exemplos se encontra em um dos pais da ciência moderna, Galileu Galilei. Essa é a sua frase que nos mostra o caminho certo, dita há quase 5 séculos

Acredito que a autoridade das sagradas escrituras quis somente persuadir os homens a respeito dos temas e proposições que sendo necessárias para a sua salvação e estando acima de todo discurso humano não poderiam ser críveis se ditos por outra ciência ou outro meio senão pela boca do próprio Espírito Santo.

Mais de mil anos antes, Agostinho já havia alertado:

Não se lê no Evangelho que o Senhor teria dito ‘envio o Paráclito que ensinará como se comportam o sol e a lua’. Ele queria formar cristãos e não matemáticos.

 

A verdade da Bíblia

Aquilo que as primeiras páginas bíblicas ensinam são elementos basilares para a vida humana: nos dizem de onde viemos e qual a nossa vocação, desvelando o comportamento humano, sobretudo no que concerne o pecado. Portanto, tudo o que diz a Bíblia é verdadeiro, embora não seja histórico.

Quando a Bíblia diz “no princípio” está dizendo que à base do ser humano está a verdade transmitida pela Bíblia: o ser humano é criado por Deus e viverá em paz com o mundo e com o próximo se observar seus mandamentos!