É um tema muito delicado que nos obriga a recorrer a um discurso um pouco filosófico.

Nós assim aprendemos: Deus é o senhor da história e governa, com seu poder, o mundo. Isso é uma conclusão que nos chega da própria Bíblia. O nome "Israel", por exemplo, segundo alguns biblistas deriva das palavras "governar" e "el" (um dos nomes de Deus) e significaria "Deus governa" ou "possa Deus governar". E com isso estamos todos de acordo. Todavia o problema nasce quando nos deparamos com tantas situações que nos alarmam, como desgraças e coisas negativas em geral. Então nos questionamos: onde está Deus, visto que ele é o Senhor da história?

Esse processo de interrogações caracterizam o típico da religião, pois faz parte de nós o fato de relacionar o nosso ‘eu’ a Deus, ao fundamento eterno do mundo, àquilo que nos trouxe à luz e nos mantém vivos e ao qual estamos destinados a voltar no momento da nossa morte.

O problema vem do fato que não pensamos a mesma coisa. Se para mim Deus é o Senhor da história, para outros não. Isto quer dizer que o ser humano não é definido por uma característica específica, mas que é livre. Não somos livres como uma tabula rasa, mas como um cruzamento onde existem múltiplas possibilidades.

Sei que isso resulta um pouco filosófico, mas é essencial para entender a presença de Deus na história. Poderíamos aqui citar as palavras de Pico della Mirandola, a propósito da criação divina do ser humano, segundo as quais Deus cria o ser humano e lhe diz: “Não ti fiz nem celeste, nem terreno, nem mortal, nem imortal, porque tu mesmo, quase livre e quase soberano, ti formasse e ti modellasse na forma que bem desejas. Tu ti poderás transformar nas coisas inferiores que são os feios; tu poderás, conforme o teu querer, transformar-ti nas coisas superiores, que são divinas” (Oratio de hominis dignitate, 131).

Se por um lado o governo divino consiste no dom da liberdade que oferece ao mundo um destino com escolhas múltiplas, por outro é importante sublinhar que Deus é uma resposta concreta às perguntas sobre a minha identidade e aquela do mundo. Temos que conciliar a liberdade do mundo de fazer as próprias escolhas com a verdade do mundo em que o ser humano foi inserido.

Creio que um bom cristão deve, primeiro de tudo, ter consciência de ser livre, mas, ao mesmo tempo, saber que a sua liberdade precisa ser entregue à vontade de Deus, à nossa dimensão primária, na certeza que Deus a conservará para sempre na reta via. Isso, aplicado à história, faz com que Deus tenha em suas mãos o nosso caminhar.