No dia 15 de agosto, as Igrejas do Ocidente (Católica) e do Oriente (Ortodoxas) celebraram a festa da Dormição e Assunção de Maria. Ela foi elevada por Cristo aos céus. Em Jerusalém, por exemplo, católicos e ortodoxos saem em procissão até o Sepulcro da Mãe de Deus, Teotokos. Num mundo marcado pela divisão do cristianismo cristão entre Oriente e Ocidente, Maria reúne seus filhos a sua volta, local da sua assunção aos céus.

Na festa da Assunção, reúnem-se em Jerusalém os ortodoxos gregos, os Armênios, os Coptas, os Sírios e os católicos romanos. A assunção de Maria marca, profundamente, a escatologia dos últimos tempos, onde acontecerá, de fato, a ressurreição do corpo que se unirá a alma no céu.  Nenhum outro santo cristão teve o privilégio que Maria teve: ser elevado em corpo e alma para o céu. Todavia, para a ortodoxia, diferentemente do catolicismo romano, a assunção ou dormição mariana não se tornou um dogma de fé, mas uma crença bi-milenar transmitida pela tradição da Igreja.

Em Jerusalém, a Igreja Sirian Ortodoxa tem um lugar reservado na tumba de Maria. Nesse lugar, celebra-se constantemente a Santa Missa na língua de Jesus (o aramaico). Há uma diferença das festas da Igreja do Oriente e do Ocidente porque os calendários são diferentes. No Oriente, entre os ortodoxos, conserva-se o calendário antigo (Juliano), enquanto no Ocidente, na Igreja Romana, o novo (Gregoriano). No entanto, algumas festas marianas, principalmente a da assunção, são celebradas nos mesmos dias tanto por Católicos Romanos como Católicos Ortodoxos.

Em Homs, na Síria, os cristãos ortodoxos sírios reuniram-se na Catedral de Nossa Senhora do Cinto. Nesse lugar, conforme a tradição, é conservado um cinto de Maria que o apóstolo Tomé tinha recebido no momento da Assunção da Virgem. O texto que segue é de S.S. Inácio Zakka I, patriarca Sírio-Ortodoxo:

Segundo a tradição, a Virgem subiu ao céu. A questão que se coloca é: a morada de sua alma equivale a dos santos, justos e devotos? Ou será que ela subiu ao céu de alma e corpo? Sua assunção ao céu em seu corpo glorificado não é algo irrelevante para o Espírito Santo do Livro Sagrado, nem à tolerância cristã das verdades confessionais. Se "Enoque andou com Deus e ele não foi encontrado, pois Deus o tomou" (Gn 5:24) e Elias, o profeta subiu ao céu em uma carruagem de fogo (2 Reis 2:11) não seria também levada ao céu a Virgem Maria, que teve o Senhor nove meses em seu ventre, deu-Lhe à luz e O amamentou, sendo considerada digna de ter seu corpo mantido sem corrupção e de tê-lo transformado em um corpo espiritual, sendo levada ao céu em corpo e alma, a fim de gozar das bem-aventuranças ao lado de seu amado filho Jesus Cristo?

Na tradição Sírio-Ortodoxa, St. Jacob do Serugh, o médico (521) assim se expressou em siríaco, sobre a morte da Virgem Maria,

Quando a virgem estava em seu leito de morte, os Anjos, os justos, os profetas e os pais do Antigo Testamento, desceram do alto pela ordem de Deus. Também vieram os doze Apóstolos e Evangelistas... eles a enterraram em uma caverna rochosa. A Glória prevaleceu no céu e na terra, quando os anjos viram sua alma subindo e voando para residências das luzes. 

No livro que se atribui a Dionísio, o Areopagita, bispo de Atenas, (95) há o seguinte relato:

(...) no momento da Dormição de Maria, todos os apóstolos vieram dos quatros cantos da terra com estranha velocidade e se reuniram acerca dela. Quando chegaram em Jerusalém, cidade onde a Virgem Santíssima morava, Jesus veio com os seus anjos. Então, Jesus recebeu sua alma e entregou-a Miguel, o Arcanjo.

A tradição católica ocidental nos diz que, no dia seguinte, (...) os Apóstolos colocaram o corpo em uma cova e guardavam o túmulo na espera que o Senhor aparecesse. Jesus apareceu mais uma vez e transferiu o seu corpo sagrado para o céu em uma nuvem. No céu, seu corpo uniu-se à sua alma, a fim de desfrutar da alegria eterna (Redemptoris Mater, & 38).

As tradições coptas e etiópicas foram introduzidas nessa contemplação do mistério de Maria por São Cirilo de Alexandria; e, por sua vez, celebraram-na com uma abundante florescência poética.  O gênio poético de Santo Efrém, o Sírio, denominado "a cítara do Espírito Santo", cantou infatigavelmente a Virgem Maria, deixando um rasto ainda visível em toda a tradição da Igreja Siríaca.  No seu panegírico da Theotókos, São Gregório de Narek, uma das mais fúlgidas glórias da Armênia, com vigoroso estro poético, aprofundou os diversos aspectos do mistério da Encarnação; e cada um destes aspectos é para ele ocasião de cantar e exaltar a dignidade extraordinária e a beleza esplendorosa da Virgem Maria, Mãe do Verbo Encarnado.

Na encíclica Redemptoris Mater do saudoso papa João Paulo II sobre a unidade dos cristãos, ele nos diz que "o Espírito Santo, apesar da relutância humana, suscita o desejo pela unidade, é ele que faz com que nossas Igrejas “se unam pacificamente num só rebanho e sob um só pastor” (Redemptoris Mater).

A nosso ver, a caminhada da Igreja, especialmente na nossa época, está fortemente marcada pelo sinal do Ecumenismo: os cristãos procuram as vias para reconstituir aquela unidade que Cristo invocava do Pai para os seus discípulos nas vésperas da sua paixão (Jo 17, 21). De acordo com o saudoso papa, “A unidade dos discípulos de Cristo, portanto, é um sinal influente para suscitar a fé do mundo; ao passo que a sua divisão constitui um escândalo”. Convoco católicos e ortodoxos a lerem essa incíclica, Lá, o papa realça o amor pela Mãe de Deus presente nas Igrejas do Oriente e do Ocidente, dizendo: “a Igreja católica, a Igreja ortodoxa e as antigas Igrejas orientais se sentem profundamente unidas no amor e louvor à Theotókos’. Essas Igrejas manifestam “os dogmas fundamentais da fé cristã acerca da Trindade e do Verbo de Deus, que assumiu a carne da Virgem Maria, foram definidos nos Concílios ecumênicos celebrados no Oriente”.

Maria é o ponto de convergência entre Católicos Romanos e Católicos Ortodoxos gerador da unidade. A mãe faz isso: busca reunir seus filhos entorno de si. Na verdade, essa unidade não é apenas um sonho de poucos, mas uma realidade que se constrói a cada dia. Em João 19, 24b está escrito: “Dividiram as minhas roupas entre si, e tiraram sortes pela minha túnica”. A túnica de Cristo não foi e nunca poderá ser dividida. A Igreja na sua dimensão espiritual jamais poderá ser dividida. "Pode-se, acaso, dividir Cristo?", dizia Paulo (1 Cor 1, 13). Nós, homens, podemos dividir a Igreja no seu elemento humano e visível, mas não a sua unidade profunda que se identifica com o Espírito Santo. A túnica de Cristo não foi e não poderá ser dividida. É a fé que professamos no Credo: "Creio na Igreja, una, santa, católica e apostólica" da Igreja indivisível. De fato, essa unidade vai ser um sinal para as Igrejas, para o mundo. Ela foi perdida, mas, em breve, vai ser recuperada. Devemos orar constantemente por ela.

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